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12/07/16

Entrevista com Izanil de Ilhabela

*Conteúdo autorizado pelo Museu da Pessoa





Maria da Silva Pinto de Albuquerque é a mais nova de vinte e seis filhos. Maria conta a história de seu nome, por ser conhecida na cidade como Izanil, nome que não consta no seu registro de identidade. Izanil conta também como era a Ilhabela de sua infância e juventude, com as cantigas de roda e as “peraltices” das festas da cidade.

Dona Izanil seguiu os passos da mãe – que por sua vez seguiu os passos de sua mãe – como parteira, sendo a responsável pelo nascimento de muitos bebês na cidade. Izanil conta também como aprendeu o ofício de enfermeira ao longo do tempo. Para encerrar seu depoimento, Izanil narra os procedimentos para a elaboração do peixe-azul com banana verde, comida típica da região.

Meu nome é Maria da Silva Pinto de Albuquerque, nascida aqui em Ilhabela (SP), dia oito de janeiro de 1928. Minha avó, Benedita Esperança da Silva, veio escrava, né? Quer dizer que já veio gorda de lá, minha mãe nasceu aqui. O meu pai conheceu a mamãe já mocinha aqui no Perequê. E aí, namoraram, casaram, ela casou nova e teve 26 filhos. Eu sou a última, por isso que eu não sei contar muitas coisas, né, porque eu fui a última filha.

Meu pai era carpinteiro, ele trabalhava muito, às vezes, levava mais de uma semana fora de casa. Aqui mesmo na ilha, mas em outros bairros, né? E nós ficamos aos cuidados da minha mãe. Minha mãe, ela trabalhava na roça, né? A profissão dela era parteira. Todo mundo vinha chamar ela e ela fez muito parto. Vinham chamar ela à noite, ela ia, já levava uma trouxinha com roupa, sabe o que é trouxinha, que eles falam? Amarravam assim e vinham chamar…

A mãe dela sabia, a mãe era parteira. A mãe dela era escrava e ela fazia parto, fazia tudo, parto mesmo das próprias mulheres, filhas dos colonos, lá… Ela fazia parto e ela aprendeu com a avó… a mamãe aprendeu com ela.

Minha casa [de infância] eu lembro que ela ainda é viva (risos). Aquela esquina ali, que tem aquele restaurante Max, ali eu nasci, naquela casa. Era uma beleza, tinha quatro quartos, casa grande e minha mãe, ela hospedava o pessoal tudo detrás da Ilha que chegava: “Madrinha Eva…”, os pais [os mais velhos a] chamavam de sinhá Eva. Então ali, o pessoal à noite, ia dormir, ela mandava fazer esteiras, forrava a sala, tinha um quarto grande, tudo de esteiras. Ela nunca falou não, nunca.

[Na hora das refeições] Ela punha uma esteira no chão, então fazia aquela roda, todo mundo sentava e, naquele tempo, era cuia, você sabe o que é cuia? Cada um já tinha a sua, não tinha prato, sabe? Era aquela cuia e tinha uma colherzinha, uma colherzinha de pau, também, tudo já tava ali. Então, ela já punha a comida pra todos, quando chegava no último: “Mãe, eu quero mais”, lá ela voltava por de volta… Tudo ali naquela cuiazinha pra gente comer.

[Sobre ser parteira]Não sei nem falar. Olha, eu fiz parto até perto lá das pancadas do mar, tinha um casebrezinho lá embaixo, era dia seis de setembro, aí o pai veio buscar, pediu ao médico uma ajuda, porque não podia levar a mulher de onde estava para a estrada. Aí, ele [o médico] disse assim: “Izanil, você vai” “Sim, doutor”, mas eu já tinha feito muito parto. “Qualquer coisa você traz a paciente. A ambulância vai levar você, vai ficar lá de plantão e qualquer coisa, vem me avisar”, aí eu fui.

Aí eu fiz o parto, porque não dava para subir com a mulher, porque era morro e era tudo apertadinho assim, ela podia até ganhar neném naquela subida. Aí, eu fiz o parto direitinho, aí o motorista: “Izanil, é melhor vai chamar o médico…”, porque ele ficou esperando, “Vai lá buscar o médico, já nasceu, mas é bom que ele venha”, aí ele foi. Até pra ele descer ficou com medo: “Eu descer nesse barranco?”, porque o mar quando batia na pedra… Batia na casa.

Eu fiz muito parto. Muitas vezes, eu ia daqui pra casa, parava uma pessoa no caminho: “Aqui não tem ninguém que faça um parto, que tá nascendo uma criança”, aí eu dali já ia, porque nesses caminhos, fazia um monte de parto. É uma grande alegria, sabe, porque a gente tá vendo nascer uma criança, meu Deus, como é que pode passar num lugarzinho tão estreitinho? Eu fiz muito parto. 

Outro dia foi no ônibus, todo mundo saltou e eu sempre salto por último, eu fui saltar e um rapaz me parou: “Escuta, você desce ou sobe ou fica parado”, ele falou assim: “Não, estou esperando a senhora mesmo. Quero segurar na sua mão” “Por enquanto não tô pedindo socorro”, comecei a brincar com ele “Não, mas eu quero pegar na sua mão”, daí, desci, sentei lá na vila, aí ela falou assim: “Sabe por que eu fiz isso?” “Não” “Porque eu não conhecia a senhora, minha mãe falou quem era a senhora, me explicou e [falou] para mim ajudar onde a senhora tivesse...”, eu nem lembrava, [ele era] moço já, né?

“Minha mãe falou, então tô segurando na sua mão. Sabe por quê?” “Por quê?” “A senhora não lembra de mim, mas eu vou dizer. Quando a senhora chegou, o médico não tava, ele não tinha chegado ainda e a senhora… Quando o médico chegou, eu já tinha nascido, a senhora que pegou. E outra coisa, tenho isso aqui doído [apontando para o bumbum]”, eu: “Por quê? Caiu?” “Não, dos tapas que a senhora me deu quando eu nasci”, eu ri com ele!


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